por Hernani Heffner
Conservatória desenvolve um turismo cada vez mais raro nos dias atuais. Nascida da expansão cafeeira fluminense, contemplada com a modernidade ferroviária ainda no século XIX e positivamente esquecida em seu cultivo do passado durante o século XX, soube como poucas cidades do interior preservar uma experiência direta e enraizada de traços culturais marcantes para inúmeras gerações de moradores e visitantes. Diferentemente de localidades que tem procurado incorporar e explorar mais recentemente um turismo apenas de lazer, com referências dúbias e imediatas, prontas para as selfies atuais, a capital da seresta vem cultivando à décadas uma relação viva com sua história antiga e recente. Em Conservatória, reviver é um verbo pleno de sentido, pois oferece aquele que busca um turismo de qualidade, não apenas conhecer lugares novos e atraentes mas também participar ativa e emocionalmente deles.
Uma das vivências mais surpreendentes de Conservatória é seu envolvimento com o cinema, em particular com as salas de exibição, hoje em dia chamadas de rua, mas que no século passado eram simplesmente o cinema do bairro, da praça, da esquina. Não se sabe exatamente quando foi a primeira sessão de cinema na cidade, provavelmente iniciativa de algum ambulante. Mas o cinema que existiu no salão paroquial, ao lado da Igreja Matriz de Santo Antonio, na praça Getúlio Vargas, a popular praça "de cima", começou suas funções há quase um século atrás. Do cineminha foi resgatado inclusive um raro projetor francês, marca Pathé Frerès, a manivela, fabricado entre 1905 e 1915. Tempo do chamado "cinema mudo", que de mudo não tinha nada, pois alguém sempre tocava para acompanhar os filmes silenciosos. A peça se encontra atualmente na Coleção Ivo Raposo e pode ser apreciada no museu de projeção que se encontra no Rancho Centímetro, no bairro Benfica.
O projetor pode ser a desculpa para ver muitos outros projetores ainda em funcionamento por lá. Na verdade, a visita vale justamente pela sessão de cinema que eles proporcionam dentro de uma verdadeira jóia rara, preservada na Serra: uma réplica em escala e com as peças originais, incluindo os projetores, dos cinemas da cadeia Metro-Goldwyn-Mayer no Rio de Janeiro, em especial o Metro-Tijuca. Reviver o ambiente de uma sessão clássica, com o mobiliário e a decoração originais, os rituais de entrada, programação e assistência, e a publicidade que a acompanhava, além dos filmes de outrora, é hoje difícil de ser encontrado de forma intacta, por conta dos poucos cinema de rua que sobreviveram nas cidades brasileiras, incluindo as capitais, e do fato de que a maioria foi bastante modificada e modernizada.
Visitar o Cine Centímetro é desses charmes raros de Conservatória. Uma oportunidade para apreciar o conjunto arquitetônico, ouvir as histórias de seu idealizador, Ivo Raposo, que apresenta as sessões especiais, e pegar um cineminha como as plateias de décadas atrás o faziam, com tudo que elas tinham direito.
Rancho Centímetro
Rua José Ferreira Borges, 205 - Benfica - Conservatória/Valença
Visitas sob agendamento pelo telefone 21 97022-8436 (Isabella Raposo)
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